segunda-feira, 3 de agosto de 2009

Enchentes

Além dos mais variados problemas causados pelo homem que assolam as grandes cidades, outros fenômenos que contam com grande participação da natureza também dificultam a vida nos centros urbanos: as enchentes.

por Aline Aquino

As áreas urbanas são as que mais expressam as intervenções humanas no meio natural. O desmatamento, as edificações, a canalização, a mudança do curso dos rios, a poluição da atmosfera, dos cursos de água e a produção de calor geram diversos efeitos sobre os aspectos do ambiente. As alterações ambientais causadas pelas atividades urbanas são sentidas pela população, tais como o aumento da temperatura nas áreas centrais, o aumento de precipitação e as enchentes. Essa última consequência do processo de urbanização teve como causa principal a construção de casas, indústrias, vias marginais implantadas nas áreas de várzeas dos rios e proximidades e é, atualmente, um problema constante nos períodos chuvosos nos principais centros urbanos.

Causas e Consequências
As enchentes são fenômenos naturais que ocorrem quando a precipitação é elevada e a vazão ultrapassa a capacidade de escoamento, ou seja, quando a chuva é intensa e constante, a quantidade de água nos rios aumenta, extravasando para as margens dos rios (áreas de várzeas). Todos os canais de escoamento possuem essa área de várzea para receber o "excesso" de água, quando ela ultrapassa os limites dos canais. Entretanto, com as interferências antrópicas (do homem), as inundações são intensificadas em vista de alterações no solo de uma bacia hidrográfica, tais como a urbanização, impermeabilização, desmatamento e o desnudamento (eliminação da vegetação).

O processo de urbanização causa mudanças no microclima das cidades. O intenso processo de desmatamento e a construção de residências, edifícios, indústrias, ocupação das áreas de várzeas e a impermeabilização do solo com asfalto acarretam no aumento de temperatura dos centros urbanos em relação às áreas periféricas (afastadas do centro) e às áreas rurais. Em algumas cidades esta diferença de temperatura pode atingir até 10°C. Além do desmatamento e da impermeabilização do solo, o consumo de combustíveis fósseis por automóveis e indústrias torna a cidade uma fonte de calor. Esse fenômeno é denominado "ilha de calor". O aumento de temperatura nos centros urbanos intensifica a evaporação; além disso, o material particulado (poluentes) em suspensão favorece a formação de núcleos de condensação na atmosfera. O resultado é o aumento da quantidade de chuvas. A tabela 1 mostra que, nas áreas urbanas, a quantidade de chuva anual é 5% maior e, em dias de chuva, a precipitação (quantidade de chuva medida) é 10% superior se comparada com as áreas rurais. No entanto, as inundações não resultam apenas do aumento da quantidade de chuva, mas - e principalmente - do aumento da velocidade de escoamento superficial ocasionado pela impermeabilização do solo. Além disso, diariamente, os rios recebem uma carga de água utilizada pela população (esgoto), o que também contribui para aumentar a quantidade de água no leito dos rios.

Diariamente os rios recebem a água do esgoto nas cidades brasileiras, o que contribui para aumentar a ocorrência de enchentes.

Em condições naturais, parte da chuva fica retida nos troncos e folhas, o escoamento superficial é retido por obstáculos naturais gerando maior infiltração e retardando a chegada da água nos cursos de água. Quando a cobertura vegetal é retirada, não há resistência ao escoamento e a água atinge os rios com maior facilidade e rapidez, contribuindo também com o assoreamento dos rios, pois, sem a cobertura vegetal, os sedimentos são carregados pela água e acabam depositados no fundo dos leitos dos rios. Este fato é agravado quando há impermeabilização do solo.

Outro fator que agrava as inundações nos centros urbanos é o entupimento dos bueiros ocasionado pelo lixo jogado nas ruas pela população. Em dias de chuva, com a impossibilidade do escoamento pelos bueiros, a água concentra-se nas ruas de forma rápida, causando transtornos no trânsito e no comércio, além de atingir residências e causar todo o tipo de estragos.

Alterações climáticas geradas pela urbanização

Fonte: DREW, D. Processos Interativos homem-meio ambiente. São Paulo: Difel, 1986.

Um perigo para a vida urbana

As enchentes representam uma ameaça para a população, especialmente nas áreas periféricas, onde há deficiência de coleta e tratamento de esgoto. Em épocas de inundações, a população tem contato com a água contaminada, contribuindo para a propagação de doenças como a leptospirose. O processo de urbanização no Brasil, atualmente, ocorre de forma intensa e, na maior parte dos casos, sem planejamento. Áreas inteiras são ocupadas e loteadas, de forma clandestina ou não, contribuindo para os processos de erosão. Esta urbanização desmesurada também leva a população a ocupar áreas dos leitos de rios ou de mananciais.

Precipitação
É o nome técnico utilizado para denominar o fenômeno climático de queda de água do céu para a superfície terrestre. A precipitação pode ser sólida (granizo); sólida em cristais (neve, ocorre quando o esfriamento da água é mais lento) e líquida (chuva propriamente dita).

Tudo isso só faz agravar a problemática das enchentes nos grandes centros urbanos. As soluções encontradas para conter, da maneira que é possível, as enchentes seguem uma linha imediatista na tentativa de alcançar a resolução do problema em um período curto de tempo. Dentre as ações, destacam-se as obras de desassoreamento dos rios (retirada dos sedimentos depositados pela água) e, consequentemente, o aprofundamento do leito, com canalização e construção de reservatórios regularizadores de vazão.

Alternativas e soluções
As medidas preventivas ideais para a solução das inundações são fundamentalmente institucionais. A atuação e fiscalização dos órgãos responsáveis (estaduais e municipais) no que tange ao uso e ocupação do solo, à utilização dos recursos hídricos e ao cumprimento da legislação seriam um bom ponto de partida para a solução do problema.

Neste sentido, a má definição de atribuições, ausência de uma política unificada e de competição entre os órgãos públicos e o conflito de projetos são fatores que influenciam na resolução dos problemas em curto prazo e o grande investimento de capital. Portanto, frente aos problemas elucidados, é necessário um planejamento urbano coerente com a gestão dos recursos hídricos e uso e ocupação do solo, respeitando as áreas de várzeas e as encostas. Ressalta-se que estas áreas podem ser ocupadas, mas de forma planejada, e as atividades devem ser compatíveis com as suas características, como, por exemplo, a implantação de parques, ciclovias, áreas para práticas esportivas ou exposições nas áreas de várzea.

A conscientização dos técnicos e da população de que as enchentes são um processo natural do regime hidrológico de um rio é essencial para a implantação de medidas preventivas que evitem os prejuízos vistos atualmente e com os quais toda a sociedade tem que arcar.

As enchentes representam uma ameaça para a população, especialmente nas áreas periféricas, onde há deficiência de coleta e tratamento de esgoto. Em épocas de inundações, a população tem contato com a água contaminada, contribuindo para a propagação de doenças como a leptospirose.

Planejamento Urbano: existente ou inexistente?

A maioria das metrópoles brasileiras cresce de forma desordenada; porém, existem leis e planos cujo objetivo é mudar esta situação.

por Marcelo Marcondes
As Políticas Públicas Urbanas, até as décadas de 1960 e 1970, eram reações, por parte do governo federal, ao ‘êxodo rural’ que o País vinha sofrendo. Estas políticas eram, em sua maioria, voltadas para a infraestrutura urbana, a saber: habitação e saneamento. Na década de 1970, foram elaboradas políticas de ordenamento urbano, por parte do Governo Federal, a fim de se definir e fomentar o ordenamento nas Regiões Metropolitanas e nas Cidades Médias.

O planejamento urbano é uma importante ação contra o crescimento urbano desordenado.
Em 1988, uma nova Constituição foi elaborada e definiu o município como um ente federativo, além de promover a descentralização da receita tributária. Assim, o Federalismo começava a se delinear no País, à medida que se descentralizava o poder estatal. Dessa forma, a partir de 1988, começou a ocorrer um repasse de renda; do Governo Federal para os Estaduais e estes repassam aos Municípios. Além disso, com a nova Constituição, os municípios ganharam o poder de legislar leis próprias, de tributar seus próprios impostos e, por fim, de ordenar o solo urbano.
Com esses poderes ‘recém-adquiridos’, fez-se necessária a elaboração de um planejamento, que visasse organizar a distribuição espacial urbana, a ocupação do solo, a aplicação de impostos, o zoneamento da cidade, a infraestrutura de serviços públicos (de saúde, educação, abastecimento de água etc.), as áreas verdes e, por fim, a expansão ordenada do espaço urbano.

Organização do Planejamento Urbano
O processo do planejamento dos Municípios, como qualquer processo governamental, carece de uma sistemática, a fim de se minimizarem ‘acidentes de percurso’ e de se cumprir um dado cronograma ou conjunto de metas essenciais ao planejamento.
Um dos principais passos para o planejamento é a institucionalização do processo planejador. Por meio desse, estabelece-se uma rotina de trabalho que delineie e execute as ações de governo, de maneira cooperativa às demais esferas governamentais (estadual e federal). A primeira atitude a ser tomada é a definição objetiva das atribuições da administração urbana; das ações que se realizará diretamente e de outras que serão postas em prática levando em conta a cooperação com as esferas federal e/ou estadual.
O segundo passo importante é ‘tomar as rédeas’ do processo de planejamento. Há que se priorizar as metas estabelecidas anteriormente pelos planos, jamais favorecendo este ou aquele grupo ou empresa ou organização, em detrimento do plano inicial. Outro importante passo é sistematizar o planejamento, a fim de que os diversos órgãos do governo e instituições da sociedade se integrem para atingir os objetivos do planejamento. Quanto maior e mais desenvolvido o município, mais complexa se torna a sistemática do planejamento, o que pode demandar apoio técnico e logístico.
Assim, para municípios de médio a grande porte, é recomendável a criação de um órgão de planejamento e coordenação, que deverá coordenar o processo de planejamento, assim como assimilar novas tecnologias, captar informações e até angariar recursos financeiros para as ações da Administração Municipal.
De acordo com o IBAM (Instituto Brasileiro de Administração Municipal), a equipe do órgão de planejamento deve ser constituída por um conjunto de profissionais e especialistas de diversas áreas, “cuja dimensão e composição serão determinadas pela amplitude das ações do órgão”. O grupo deverá ser familiarizado com a prática do planejamento urbano e com as áreas de atuação da Administração Municipal.
Por fim, o órgão de planejamento deve procurar sempre trabalhar cooperando com as demais secretarias e setores da Prefeitura. A metodologia do planejamento é sua principal responsabilidade e deve ser transmitida a todos os setores da Prefeitura, fomentando a tomada de decisões e estudando todas as probabilidades (de sucesso ou fracasso), os recursos (disponíveis e a serem angariados), oportunidades (de parceria, por exemplo), riscos e limitações.
Instrumentos do Planejamento urbano
Ainda segundo o IBAM, a elaboração de planos é essencial para que se comece a efetuar o processo de planejamento do Município. Assim, a administração local (conjuntamente com o órgão de planejamento, quando houver) deve criar planos para que tudo corra da maneira mais correta e eficiente possível. O plano plurianual de investimentos e o plano diretor são obrigatórios por lei para “todas as sedes municipais com mais de 20 mil habitantes”. Porém, outros planos (vide box) fazem-se necessários, devido à complexidade de alguns municípios, notadamente os de maior porte. Assim, a Lei Orgânica Municipal e a Constituição Estadual podem também estabelecer a obrigatoriedade de outros planos, como o plano de ação governamental.
Planejamento para cidades pequenas
O processo de planejamento urbano não é exclusivo ao ambiente metropolitano. Mesmo que a Constituição Federal obrigue municípios com mais de 20 mil habitantes a elaborarem um plano diretor, assim como um plano plurianual de investimentos, isso de maneira alguma quer dizer que ambientes urbanos com população inferior aos 20 mil não possa (ou não seja recomendado a estes) efetuar o processo de planejamento urbano. As pequenas (e médias) cidades também necessitam de um plano de metas e diretrizes a serem perseguidos (e porventura alcançados).
Nessas cidades, o plano diretor deve incluir o detalhamento de leis urbanísticas, a fim de enviar propostas efetivas para o desenvolvimento urbano, procurando simplificar o processo de planejamento. Em tais municípios, o órgão de planejamento pode ser constituído, minimamente, pelo prefeito e seus auxiliares diretos, munidos de um roteiro de trabalho que pressuponha e permita a consulta à população sobre as melhorias a serem perseguidas.
Há, assim, que se pensar e se articular soluções para um melhor aproveitamento do espaço urbano, dos recursos disponíveis e, quiçá, ‘inventar’ soluções e propostas para um melhor ordenamento do espaço urbano.

Há, assim, que se pensar e se articular soluções para um melhor aproveitamento do espaço urbano, dos recursos disponíveis e, quiçá, ‘inventar’ soluções e propostas para um melhor ordenamento do espaço urbano.
Outros planos
Conheça as variedades de categorias de planejamento urbano

Plano Plurianual de Investimentos

Determina e identifica financeiramente, ao longo do mandato político da administração local, os gastos anuais necessários para a concretização das obras e projetos estabelecidos no plano de ação governamental ou no plano diretor.

Ele permite a elaboração adequada do orçamento anual (outro instrumento de planejamento urbano). O orçamento anual deve traduzir em linguagem financeira todas as ações e despesas que a Administração desenvolverá durante o processo de planejamento.

Plano de Ação Governamental

É o plano que deve dispor cada novo administrador municipal (prefeito), ao início do mandato, com as diretrizes e metas a serem tomadas e perseguidas durante seu mandato político. É um instrumento de planejamento de médio prazo, que – é crucial que – leve em conta os objetivos do plano diretor e os recursos (financeiros, em sua maioria) disponíveis para sua execução.

Assim, ele deve dispor de alguns elementos. Um primeiro elemento, básico, é a identificação dos principais problemas urbanos (do município, da cidade). Outro elemento importante à ação governamental é a definição de diretrizes e metas de Governo. Deve ainda estimar o custo dos investimentos e dos desembolsos correntes e determinar as fontes de financiamento àquelas metas e diretrizes: receitas próprias, empréstimos (FMI, BID, BIRD, etc.) e transferências automáticas (decorrente dos impostos urbanos ou de repasses estaduais e/ou federais) e voluntárias (repasses das outras esferas de governo mediante convênios).

Plano Diretor

Consoante à Constituição Federal, a política de desenvolvimento urbano obrigatoriamente deve ser executada pelo Poder Público Municipal. Neste processo, as outras esferas governamentais (governo estadual e federal) podem e devem supervisionar esse processo. Exigido pela Constituição (como já foi dito antes) para municípios de mais de 20 mil habitantes, o plano diretor é o instrumento da política de desenvolvimento urbana. Seu principal objetivo é atuar no processo de desenvolvimento local, permitindo uma maior compreensão dos fatores políticos, econômicos e financeiros e territoriais circunscritos ao município.

Outros objetivos do plano diretor são: servir de referência à ação de governo, esteja vinculado a qualquer processo de planejamento preexistente ou anterior; recrutar a participação pública (na forma de conselhos, comitês ou comissões representativas), seja na elaboração do plano, seja em sua implementação, ou no seu acompanhamento; por fim, o plano diretor deve se estender a todo o espaço municipal seja ele habitado ou não, sem, de maneira alguma, negligenciar áreas em benefício de outras.

É preciso também que o plano diretor não ignore o contexto regional no qual o município está inserido (por exemplo, no caso de São Paulo, a RMSP). Por meio do plano diretor, define-se:

- O zoneamento e o uso do solo urbano;
- A gestão tributária;
- A gestão urbana;
- A gestão pública (social);
- A gestão ambiental;
- A gestão educacional;
- A expansão, sustentável, do espaço urbano.

Problemas

Problemas no processo de planejamento podem ocorrer e devem ser contabilizados e considerados. Cronogramas de execução de obras públicas que tinham todos os elementos para darem certo e serem aplicados de forma eficaz depararam-se com o fracasso, pois não foi feita uma devida análise de riscos. Alguns problemas que podem ocorrer durante o processo de planejamento, constituindo-se em barreiras ao mesmo são:

A localização do principal órgão de planejamento na estrutura hierárquica: Se ao órgão planejador não for dada a devida importância e o poder devido para planejar, há um grande chance de o planejamento proposto ser ‘editado’ e não sair como deve;

Conflitos de jurisdição, resistência, desconfiança e outros tipos de reação que dificultam o processo: Se, por parte do setor privado da sociedade, não houver cooperação ou investimento, o processo de planejamento é dificultado; da mesma forma, se um plano esbarra na legislação do município, encontrando barreiras judiciais para sua implementação, ele fica debilitado;

O campo de competência do órgão planejador e as inter-relações com outras unidades: Se não houver um diálogo do órgão planejador com outros órgãos (por ex: SABESP, CETESB, etc.) e secretarias (por ex: LIMPURB, Secretaria de Educação, Secretaria da Saúde, de Obras Públicas etc.) aumenta a chance de serem vetados alguns planos;

Por fim, falta de apoio, participação e desaprovação por parte da população: Obras de médio e grande porte podem ser paralisadas ou cessadas devido à pressão da população; a participação pública no planejamento urbano é essencial, manifestando os desejos e opiniões públicos.

Todos os problemas apontados devem ser contabilizados numa análise de riscos, para que sejam devidamente calculados a priori da execução do planejamento, a fim de minimizá- los ou solucioná-los.